domingo, 17 de fevereiro de 2013

Foi um prazer ter você no Rio



Com a violência da cidade, ninguém prestou atenção quando Mirina começou seu trabalho. Uma prostituta esfaqueada nos Arcos da Lapa, um ambulante na praia de Copacabana... O caso ganhou os noticiários somente quando encontraram a velhinha entre as árvores do Jardim Botânico. E, com a Copa do Mundo se aproximando, o Maracanã vivia sob a mira dos holofotes; não demoraram a encontrar mais um. Só então deram importância para o cartão-postal que ela deixava junto aos corpos com os dizeres: “Foi um prazer ter você no Rio”.

No princípio quisera apenas saber qual seria a sensação. Depois, Mirina passou a sentir um prazer visceral a cada vida que tirava. Ao receber a atenção da polícia e da mídia, a adrenalina começou a correr ainda mais rápido em suas veias. E a excitação gerada a incitava a continuar.

Lapa, Copacabana, Jardim Botânico, Barra da Tijuca, Maracanã. O Pão de Açúcar tinha sido o local que escolhera para aquela tarde. Só de imaginar o que sentiria ao completar seu trabalho, Mirina exultava. Observou a sua próxima vítima, um jovem que terminara sua aventura nas trilhas do Morro da Urca, sentindo uma ponta de tristeza pela juventude que iria desperdiçar. Contudo, ele teria seu propósito no conturbado esquema que ela traçara em seu íntimo.

Estava a poucos passos do rapaz. A lâmina fria da adaga que trazia junto à cintura a deixava consciente do que teria que fazer. Todavia, no último instante, Mirina sentiu a frustração sufocá-la. Havia mais policiais na área do que apenas os soldados que serviam ali. Já deveriam ter percebido sua predileção por pontos turísticos. Passou por seu alvo, que sorria sem saber do que escapara, até alcançar a areia da Praia Vermelha, onde aguardou o pôr do sol.

Enquanto esperava, Mirina reformulou seus passos. Sua aparência tranquila escondia o turbilhão em sua mente. Podia desistir de tudo e seguir sua vida. Não acreditava que conseguiriam realmente ligá-la aos crimes. Mesmo não cuidando de mudar a letra ao escrever as mensagens ou de usar luvas para ocultar suas digitais. Na verdade, orgulhara-se de cada ato, para se afetar com esses detalhes. E era exatamente isso que a impedia de parar. Decidida, vasculhou a paisagem em busca de alguém a quem pudesse usar para concluir o que viera fazer. A oportunidade surgiu na forma de um senhor, visivelmente embriagado com as belezas naturais cariocas, parado na descida do bondinho...

Mirina tomava todos os cuidados para passar despercebida. Não podia ser apanhada logo agora que estava prestes a terminar, mas sabia que a policia estava chegando perto. Fora descuidada no dia anterior, esquecera-se por completo das câmeras de segurança existentes no largo do Bondinho, e com isso, a polícia agora tinha pistas suficientes para deixá-la preocupada. O aviso sonoro alertava para o embarque imediato do próximo voo a decolar e Mirina controlou seus passos para que não parecesse apressada demais. Passou pelos corredores e entrou no avião sentindo que deixara seu trabalho incompleto. Queria ter visitado o Cristo Redentor uma última vez e, quem sabe, tomado outra vida sob aquela vista maravilhosa, talvez aos pés da estátua. Contudo, assim que o avião que estava alcançou os céus, percebeu que esse era apenas um detalhe. O Brasil era muito grande e em São Paulo também encontraria cartões-postais dignos dela.

1 comentários:

Pandora disse...

Adorei, Pri! Amo histórias curtas. Dar vida e encerrar um personagem em poucas linhas é uma das artes mais impressionantes pra mim. E quando fica tão perfeito assim, ao contrário da maioria, eu sinto que uma continuação destruiria a beleza.

Beeeeijos!

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